A arboricultura é uma profissão essencial e ao mesmo tempo arriscada, que exige atenção redobrada em todas as etapas de trabalho, seja na poda, corte ou remoção de árvores. Entre abril de 2020 e agosto de 2024, foram coletados dados de 349 acidentes em operações com árvores nos Estados Unidos, através da plataforma de notificação pertencente à TCIA (Tree Care Industry Association), disponível em www.accidentbriefs.tcia.org/, para este artigo, fornecendo insights valiosos sobre as causas, os fatores de risco e possíveis soluções para mitigar esses incidentes. A Tree Care Industry Association (TCIA) é uma associação comercial dos Estados Unidos que representa mais de 1.800 empresas de cuidados com árvores, e tem como objetivo promover a segurança e a educação no setor de arboricultura. Mais informações podem ser encontradas em www.treecareindustryassociation.org/.
Operações com Árvores no Brasil
A existência deste artigo é motivada pela necessidade de compreender e mitigar os riscos associados às operações de arboricultura. A análise dos acidentes registrados nos Estados Unidos oferece insights que podem ser aplicados em contextos globais, inclusive no Brasil, onde as operações de poda e remoção de árvores também envolvem riscos significativos para os trabalhadores. Embora o contexto brasileiro tenha suas particularidades, como legislação trabalhista específica, diferenças climáticas e condições socioeconômicas, muitos dos riscos identificados são semelhantes. É fundamental que as lições aprendidas em outros países sejam adaptadas e aplicadas localmente, promovendo um ambiente de trabalho mais seguro e eficiente para os profissionais de arboricultura no Brasil.
Análise dos Dados de Acidentes: Gravidade e Causas
Os acidentes analisados no estudo variaram em gravidade, desde incidentes fatais a ocorrências leves. A classificação foi feita com base nos seguintes parâmetros:
Acidentes Fatais: 209 casos (59,8%)
Acidentes Graves: 100 casos (28,7%)
Acidentes com Salvamento: 22 casos (6,3%)
Acidentes Leves: 10 casos (2,9%)
Acidentes Fatais Graves: 8 casos (2,3%)
A alta proporção de acidentes fatais (quase 60%) destaca a natureza perigosa das operações com árvores, onde um erro ou falha de equipamento pode ter consequências devastadoras. Dentre os 349 acidentes, 192 envolviam trabalhadores do sexo masculino, 9 envolviam mulheres e 148 não tiveram o sexo identificado. Totalizando os 349 acidentes registrados, o sexo das vítimas foi distribuído da seguinte forma:
Principais Causas dos Acidentes
Principais Causas dos Acidentes
Os acidentes foram classificados por suas causas principais, identificando os seguintes fatores de risco:
Impacto por Objeto: 139 acidentes (39,8%) - A maioria dos acidentes ocorreu devido ao impacto de galhos, troncos ou outros objetos que atingiram os trabalhadores durante operações de poda ou remoção. Esses tipos de acidentes ressaltam a importância do uso de técnicas adequadas para controlar a queda de materiais, além do uso consistente de equipamentos de proteção individual, como capacetes e protetores faciais.
Queda: 54 acidentes (15,5%) - As quedas foram responsáveis por uma parte significativa dos acidentes, ocorrendo frequentemente durante a escalada de árvores ou o uso de plataformas elevatórias e escadas. A ausência de pontos de ancoragem seguros, a má utilização de cintos de segurança e o treinamento insuficiente são fatores que contribuem para esse tipo de acidente. O uso adequado de equipamentos de proteção contra quedas e o treinamento regular são essenciais para reduzir esses riscos.
Choque Elétrico: 43 acidentes (12,3%) - Trabalhos em proximidade a linhas de energia elétrica representaram um risco. A falta de inspeção prévia da área e de medidas de segurança, como desenergização das linhas ou sinalização adequada, são as principais causas. Para mitigar esses acidentes, é necessário que os trabalhadores sejam treinados para identificar e evitar riscos elétricos e sigam protocolos de segurança rigorosos em áreas urbanas.
Preso ou Esmagado por Algo: 38 acidentes (10,9%) - Trabalhadores presos ou esmagados sob troncos ou galhos durante a movimentação ou queda destes. Isso destaca a importância de técnicas adequadas de movimentação e comunicação clara entre a equipe.
Veículo: 25 acidentes (7,2%) - Acidentes relacionados ao uso de veículos como caminhões e maquinário pesado durante as operações. Esses incidentes geralmente acontecem durante o transporte de materiais ou quando há falhas na operação de veículos próximos aos trabalhadores.
Resgate: 19 acidentes (5,4%) - Esses acidentes referem-se a trabalhadores que foram resgatados de situações onde estavam presos, geralmente em alturas nas árvores, após ficarem imobilizados. O risco elevado se deve à complexidade e urgência dessas situações. Garantir a segurança durante essas operações envolve treinamento especializado em técnicas de resgate e uma coordenação eficiente da equipe.
Incerteza: 11 acidentes (3,2%) - Alguns acidentes tiveram causas que não puderam ser identificadas ou documentadas claramente, o que destaca a importância de melhorar os procedimentos de registro e investigação de acidentes.
Corte: 7 acidentes (2%) - Acidentes envolvendo o uso de serras e outros equipamentos de corte, muitas vezes devido ao manuseio inadequado ou à falta de treinamento adequado dos trabalhadores.
Violência no Local de Trabalho: 3 acidentes (0,9%) - Incidentes que envolveram agressões físicas durante as operações, destacando a necessidade de promover um ambiente de trabalho seguro e respeitoso.
Esses dados indicam que a maioria dos acidentes ocorre devido ao impacto com objetos como galhos e troncos, seguido por quedas de altura e contato com linhas de energia. A presença de choques elétricos como uma das principais causas ressalta a necessidade de cautela em trabalhos próximos a infraestruturas elétricas.
Equipamentos como Causadores de Acidentes
Os equipamentos desempenharam um papel crucial nos acidentes registrados. Abaixo, uma análise detalhada dos principais equipamentos envolvidos nos acidentes:
Caminhão: 112 acidentes (32,1%) - Caminhões são usados no transporte de madeira e equipamentos ou como plataformas de trabalho. Problemas como falhas nos freios, manobras incorretas e falta de visibilidade do operador são causas frequentes de acidentes envolvendo caminhões. Manutenção preventiva e capacitação para operadores são fundamentais para evitar tais incidentes.
Elevador/Plataforma: 30 acidentes (8,6%) - Plataformas elevatórias são essenciais para alcançar grandes alturas, mas são equipamentos que apresentam riscos elevados, como quedas de trabalhadores e falhas mecânicas. Estabilidade da superfície de apoio e uso correto dos cintos de segurança são essenciais para a operação segura.
Cesto: 16 acidentes (4,6%) - Cestos acoplados a plataformas ou guindastes são responsáveis por acidentes quando há falhas de equipamento ou quando os trabalhadores caem devido à falta de proteção adequada. Inspeções regulares e o uso de equipamentos de segurança são importantes para prevenir acidentes.
Serra: 12 acidentes (3,4%) - As serras, incluindo motosserras, são ferramentas críticas, mas perigosas. Acidentes geralmente ocorrem devido ao manuseio inadequado, falta de manutenção e desatenção durante o uso. Treinamento adequado é crucial para garantir que os operadores estejam preparados para manusear esses equipamentos com segurança.
Picador: 11 acidentes (3,2%) - Picadores de galhos são usados para triturar restos de madeira, mas apresentam riscos significativos, especialmente durante o procedimento de alimentação de galhos. Falhas operacionais, distrações e falta de EPIs são causas comuns de acidentes com picadores.
Aparador: 7 acidentes (2%) - Os aparadores são utilizados para cortar pequenos galhos e folhagens. Acidentes envolvendo aparadores ocorrem, geralmente, por uso inadequado ou falta de proteção adequada, especialmente para os olhos e as mãos dos operadores.
Corda: 6 acidentes (1,7%) - As cordas são essenciais para o controle de galhos durante a poda e para a escalada. Acidentes ocorrem devido a falhas nas amarrações, desgaste da corda ou uso impróprio. Manter as cordas em boas condições e garantir o treinamento adequado no uso são passos importantes para reduzir o risco.
Escada: 5 acidentes (1,4%) - Escadas são amplamente utilizadas em operações de arboricultura, mas a falta de estabilidade e o uso em superfícies irregulares são causas frequentes de quedas. Escadas precisam ser firmemente apoiadas, e a segurança do operador deve ser garantida.
Troncos: 4 acidentes (1,1%) - Acidentes como esses ocorrem principalmente durante o corte e a movimentação de troncos. Lesões por esmagamento e impacto são comuns devido à falta de um planejamento adequado para a movimentação segura desses materiais.
Veículo: 3 acidentes (0,9%) - Além de caminhões, outros veículos também estiveram envolvidos em acidentes, geralmente durante o transporte de trabalhadores ou equipamentos. Treinamento de motoristas e manutenção preventiva são vitais para minimizar esses riscos.
Arnês/Cinto de Segurança: 2 acidentes (0,6%) - Acidentes envolvendo cintos de segurança ocorreram devido ao uso incorreto ou à falta de pontos de ancoragem seguros. Treinamento em segurança do trabalho em altura é necessário para reduzir esses incidentes.
Trituradores: 2 acidentes (0,6%) - Trituradores de galhos são usados para triturar restos de árvores, e acidentes geralmente acontecem devido à operação inadequada e à falta de proteção dos operadores. Treinamento sobre o uso seguro e a necessidade de EPIs é essencial.
Toco: 2 acidentes (0,6%) - Tocos de árvores podem se tornar obstáculos e causar acidentes, principalmente tropeços e quedas, quando não são removidos ou sinalizados adequadamente após cortes.
Guindaste: 2 acidentes (0,6%) - Guindastes são utilizados para levantar grandes galhos e troncos. Falhas na comunicação entre operadores e a equipe no solo, bem como problemas mecânicos, são fatores que contribuem para os acidentes.
Trator: 2 acidentes (0,6%) - Tratores são utilizados para arrastar troncos e limpar áreas, e os acidentes geralmente ocorrem devido à operação imprópria e falta de manutenção do equipamento.
Braço Mecânico: 2 acidentes (0,6%) - Braços mecânicos são úteis para tarefas pesadas, mas apresentam riscos elevados, especialmente se operados sem o devido cuidado ou sem comunicação adequada com a equipe.
Meses dos Acidentes e Sazonalidade
A análise dos acidentes por mês mostra variações significativas na frequência de incidentes ao longo do período avaliado, de abril de 2020 a agosto de 2024. Essas variações podem ser associadas a fatores sazonais, condições climáticas e períodos de maior demanda por serviços de arboricultura. Aqui estão as médias mensais calculadas:
Janeiro: 6,25 acidentes
Fevereiro: 6,75 acidentes
Março: 7,5 acidentes
Abril: 7 acidentes
Maio: 8 acidentes
Junho: 6,6 acidentes
Julho: 9 acidentes
Agosto: 8,25 acidentes
Setembro: 8 acidentes
Outubro: 5,75 acidentes
Novembro: 7 acidentes
Dezembro: 7,33 acidentes
Alta Demanda por Serviços de Arborização e Paisagismo no Verão Americano
Durante os meses de verão nos Estados Unidos, que vão de junho a setembro, houve um aumento significativo na demanda por serviços de poda, corte de árvores e manutenção de jardins. Este aumento está associado ao clima favorável, incentivando pessoas e empresas a realizarem projetos ao ar livre. Esse período, principalmente entre junho e setembro, é marcado por um volume elevado de atividades, o que resulta em mais acidentes. Além disso, os meses próximos ao verão, como abril, maio e outubro, também são considerados favoráveis para este tipo de trabalho, devido ao clima ameno que facilita a execução de atividades ao ar livre e a preparação para a alta demanda que ocorre no verão.
Outros fatores que contribuem para o aumento dos acidentes no verão incluem:
Condições Climáticas Extremas: Tempestades severas, furacões e outras condições climáticas extremas nos Estados Unidos, especialmente nos estados do sul e leste, criam uma demanda urgente por remoção de árvores caídas, aumentando o risco para os trabalhadores.
Maior Uso de Equipamentos Perigosos: Há um aumento no uso de equipamentos como motosserras, trituradores de madeira e plataformas elevatórias. Esses equipamentos são responsáveis por um grande número de acidentes, principalmente quando operados por trabalhadores não treinados ou sem uso adequado de EPIs.
Trabalho Sazonal e Contratação Temporária: Muitas empresas contratam trabalhadores temporários durante os períodos de maior demanda. Trabalhadores sazonais, por vezes, não possuem treinamento adequado, aumentando a probabilidade de acidentes.
Esses dados evidenciam a importância de um planejamento cuidadoso e de treinamentos contínuos, principalmente nos períodos de alta demanda, para reduzir os riscos e promover operações seguras na arboricultura.
Nuvem de Palavras: Um Olhar Detalhado sobre os Acidentes
Uma nuvem de palavras é uma representação visual que mostra as palavras mais frequentes em um texto ou conjunto de dados, onde o tamanho de cada palavra é proporcional ao número de vezes que ela aparece. Por exemplo, ao analisarmos os 349 relatos de acidentes em operações com árvores, criamos uma nuvem de palavras que destacou termos como "árvore", "acidente", "queda" e "trabalhador". Isso nos ajudou a identificar rapidamente que grande parte dos acidentes estava relacionada à queda de árvores e ao uso inadequado de técnicas e equipamentos de segurança. A nuvem de palavras nos permite visualizar, de forma clara, quais são os principais fatores de risco e como esses elementos se conectam.
As palavras extraídas dos relatos de 349 acidentes em operações com árvores nos Estados Unidos traz à tona ideias importantes sobre a frequência dos termos mais recorrentes e suas associações. A análise desses termos ajuda a identificar padrões e lacunas que podem estar contribuindo para os acidentes, assim como indicar áreas críticas para a melhoria da segurança dos trabalhadores. Abaixo, uma interpretação dessas ocorrências:
Os termos mais frequentes como "árvore" (142 ocorrências), "acidente" (132 ocorrências) e "trabalhador" (129 ocorrências) destacam claramente que estamos lidando com incidentes envolvendo pessoas diretamente ligadas às operações de manejo de árvores.
O termo "ferido" aparece 120 vezes, e "fatal" surge em 118 ocasiões, o que sublinha a gravidade dos acidentes registrados, em muitos dos quais os trabalhadores ficaram seriamente feridos ou até perderam a vida.
A palavra "queda" teve 110 ocorrências, enquanto "corda" foi mencionada apenas 14 vezes. Essa disparidade nos leva a concluir que a baixa utilização de cordas ou de técnicas seguras de escalada pode estar associada ao grande número de quedas. A falta de sistemas de ancoragem adequados e o uso insuficiente de técnicas de segurança durante atividades em altura parecem ser fatores recorrentes para acidentes desse tipo.
Da mesma forma, o baixo número de ocorrências envolvendo "cinto de segurança" (9 vezes) indica que muitos trabalhadores possivelmente não estavam usando equipamentos de proteção adequados durante o trabalho em alturas. Isso, combinado com o elevado número de quedas, revela uma importante lacuna no cumprimento dos protocolos de segurança, o que precisa ser abordado urgentemente para proteger os trabalhadores.
Outros termos como "corte" (98 ocorrências), "serra" (31 ocorrências) e "motosserra" (5 ocorrências) indicam que os acidentes envolvendo ferramentas de corte também são frequentes. Muitas das lesões, sejam graves ou fatais, estão relacionadas ao uso inadequado de equipamentos de corte, como serras e motosserras, devido ao manuseio impróprio, manutenção insuficiente ou ausência de proteção adequada.
Além disso, "veículo" (78 ocorrências), "caminhão" (71 ocorrências), "elevador" (30 ocorrências) e "plataforma" (57 ocorrências) indicam que uma grande parte dos acidentes está associada ao uso de veículos e plataformas de trabalho em altura. O uso incorreto ou a falta de manutenção desses equipamentos são problemas frequentemente observados, resultando em lesões ou acidentes graves.
Também chama a atenção o número significativo de ocorrências de termos como "preso" (70 vezes) e "resgate" (19 vezes), que se referem a situações onde os trabalhadores ficaram presos sob troncos ou em locais elevados. Esses casos ressaltam a importância de se ter procedimentos de resgate bem estabelecidos e uma comunicação clara entre os membros da equipe para evitar situações que possam se agravar rapidamente.
Finalmente, palavras como "fogo" e "incêndio" (ambas com 66 ocorrências) indicam que há riscos associados ao uso de equipamentos que podem provocar incêndios, seja por faíscas ou por armazenamento inadequado de combustíveis. Essa correlação aponta para a necessidade de medidas rigorosas de prevenção contra incêndios, como a manutenção adequada dos equipamentos e a disponibilização de extintores no local de trabalho.
A análise da nuvem de palavras evidencia diversas áreas de risco que precisam ser abordadas para tornar as operações de arboricultura mais seguras. A relação entre a alta frequência de "queda" e a baixa incidência de termos como "corda" e "cinto de segurança" mostra claramente a necessidade de melhorias nas práticas de segurança, especialmente no uso de EPIs e nas técnicas de escalada e ancoragem. Adotar essas medidas pode resultar em uma significativa redução no número de acidentes e proporcionar um ambiente de trabalho mais seguro para todos os envolvidos.
Com tudo isso em mente, é claro que o manejo de árvores e as operações de arboricultura são atividades que envolvem riscos elevados e exigem preparo, atenção e segurança. Cada incidente reportado, seja uma queda, um choque elétrico ou um impacto por objeto, reforça a necessidade de melhorias constantes nas práticas e treinamentos dos trabalhadores.
Assim como subirmos numa árvore, este artigo nos mostrou que é necessário um equilíbrio cuidadoso entre conhecimento técnico, uso correto dos equipamentos e uma mentalidade de segurança em primeiro lugar. Cada detalhe, desde o posicionamento de cordas até a revisão de equipamentos, pode ser a diferença entre um dia de trabalho seguro e um acidente.
Portanto, para todos os envolvidos nessa área apaixonante e desafiadora, continuem aprendendo, evoluindo e praticando a segurança. Afinal, a meta é simples: subir, fazer o trabalho bem feito e descer em segurança. Seja na poda, no corte ou em qualquer operação, manter-se seguro é prioridade.
Felipe Silveira
Arborista Certificado ISA - N. BR-0024A
Tree Climber Specialist TCIA
Mecânico de motores dois tempos
Pós-Graduado Arborização Urbana pela UFRRJ
Arborista do Time Husqvarna Brasil
Certificado B.L.S
Inspetor de Equipamentos de Escalada
Técnico em Segurança do Trabalho